Naquele contexto, a palavra imagem era empregada para designar
uma representação mental mnemônica, elaborada sem as estimulações sensórias
correspondentes, ou seja, uma representação consciente de objetos ou de
processos anteriormente percebidos pelos sentidos. Nesse caso, que entende a
imagem apenas em relação aos processos perceptivos dos quais deriva, atribui-se
a ela uma conotação secundária em face do papel que ela desempenha na psique.
Na concepção psicanalítica, além de representações mentais
mnemônicas derivadas da percepção consciente, as imagens adquirem uma função
dinâmica, uma vez que, para Freud, elas possibilitam a transferência da energia
instintiva que não encontra seu objeto no campo da fantasia. "Os conteúdos
das imagens mentais podem, mesmo sem intenção consciente da vontade, provocar o
impulso à realização do que foi proposto em forma ideal ou imaginária"
(Arnold et al., 1982, p. 204).
Para a Psicologia Analítica, a imagem não é apenas uma
representação visual, resultado da percepção sensorial, da atividade mnemônica
ou da transferência da energia psíquica, mas a linguagem básica da psique,
criativa e autogeradora em si mesma. Assim, a imagem é também resultado da
capacidade inerente da psique de agrupar elementos, de natureza perceptiva ou
não, em gestalten – imagens primordiais –, que lhes atribuem forma, significado
e dinamismo específicos. A imagem primordial é "um organismo de vida
própria, 'dotado de força geradora', pois é uma organização herdada de energia
psíquica, sistema sólido que não é somente expressão, mas também possibilidade
de desencadear o processo energético" (Jung, 1921/1991, p. 422).
A mera percepção não é o fato que constitui o psíquico, do
mesmo modo que o ato puro não passa de um sistema reflexo de ação e reação,
ambos mais próprios à esfera biológica. No entanto, o que é percebido pelos
sentidos – cheiro, gosto, textura, cor ou som –, ou as potencialidades
instintivas inatas – arquétipos –, que se constelam no campo psíquico, fazem-no
por meio de imagens.
A imagem interna é uma grandeza complexa que se compõe dos mais diversos materiais e da mais diversa procedência. Não é um conglomerado, mas um produto homogêneo, com sentido próprio e autônomo. A imagem é uma expressão concentrada da situação psíquica como um todo e não simplesmente ou sobretudo dos conteúdos inconscientes. É certamente expressão de conteúdos inconscientes, não de todos os conteúdos em geral, mas apenas dos momentaneamente constelados. Essa constelação é o resultado da atividade espontânea do inconsciente, por um lado, que sempre estimula a atividade dos materiais subliminares relevantes e inibe os irrelevantes. A imagem é, portanto, expressão da situação momentânea, tanto inconsciente quanto consciente. Não se pode, pois, interpretar seu sentido só a partir da consciência ou só do inconsciente, mas apenas a partir de sua relação recíproca. (Jung, 1921/1991, p. 418)
Ao refletir a natureza paradoxal da psique, a imagem
apresenta-se à consciência de forma ambígua e multifacetada. Forma-se a partir
da percepção como também da intuição, ou seja, os elementos que a compõem não
podem ser reduzidos aos processos perceptivos, na medida em que também se
originam da captação da realidade pela via do inconsciente. Nesse caso, a forma
recebida pela imagem é concebida pela base arquetípica da psique.
Contrariamente ao conceito, resultado do processo de depuração do pensamento
racional, a imagem tem um componente ideativo associado a uma constelação emocional;
é, ao mesmo tempo, uma ideia e uma emoção.
A imagem não se restringe ao aspecto visual, à imagem ou à
representação de algo na consciência por meio de uma forma visualmente
reconhecível ou representável. Tampouco é um fenômeno estático cuja forma se
cristaliza numa configuração acabada. A imagem é um modo de percepção e
captação de natureza fluida e dinâmica que se constitui no próprio ato da
consciência.
Em outras palavras, a imagem é a consciência em seu estado
puro; ocorre toda vez que a experiência do indivíduo encontra expressão na
psique, seja pela via da percepção &– visual, tátil, olfativa, gustativa ou
auditiva &–, seja pela da intuição, da emoção, da linguagem ou do sentido.
Nesses casos, forma-se uma gestalt, que, embora inicialmente não possa ser
apreendida racionalmente, pode ser reconhecida pela consciência, o que lhe
possibilita a captação do experienciado.
Uma imagem pode permanecer em seu estado bruto, como uma forma direta de captação, assim como pode exercer na consciência um papel metafórico, rico em conexões e possibilidades de sentido. Quando a imagem é ativada, a consciência se movimenta, articulando-se em busca de compreensão e de ampliação.
É por intermédio da imagem que a consciência pode se auto-observar em sua eterna constituição, em seu fluxo criativo. Sua expressão é fluida e dinâmica, uma vez que reflete o processo psíquico em seu desenvolvimento contínuo, em contraste com a tendência unilateralizante e cristalizadora do ego. Entretanto, se a imagem for depurada pela explicação racional, ela perde sua vitalidade, é dissecada e reduzida a ideias e conceitos estáticos e esquemáticos.
A imagem é a linguagem da expressão natural da psique, base
de todos os processos psíquicos. Nesse sentido, ela tem coerência e validade em
si mesma, sem necessidade de ser traduzida ou transposta para outros sistemas
ou linguagens. Ela é a matéria-prima da psique, que pode ser trabalhada,
cultivada, ativada, contemplada, mas não reduzida a explicações ou a conceitos.
Presentemente, questões referentes às imagens psíquicas, bem como às possibilidades de favorecimento de um cultivo das imagens na psicoterapia, vêm sendo cada vez mais discutidas. Pode-se mesmo dizer que todas as tendências terapêuticas atuais fazem uso, mais ou menos consciente, de uma abordagem clínica que inclui o trabalho com imagens. Das terapias behavioristas, que acreditam nas possibilidades transformadoras do poder de representação por meio de imagens &– visualização &–, às terapias que trabalham com a vivência e interpretação de sonhos, recorre-se às imagens como possibilidade de acesso e de intervenção nos processos psíquicos.
Dependendo da proposta terapêutica, como as de Desoille
(1945), Leuner (1985) e Silveira (1982), que privilegiam exclusivamente a
produção de imagens, bem como as que utilizam técnicas imagéticas como um
recurso terapêutico, atribui-se mais ou menos importância ao fluxo das imagens.
Mc Mahon e Sheikh (1984) propõem a classificação das múltiplas abordagens da imagem em quatro categorias:
1. abordagens que se baseiam nos modelos de Pavlov e Skinner
e tratam da relação entre imagens e reações emocionais e de seu uso como
estímulos nos métodos de condicionamento;
2. abordagens que utilizam a produção de imagens como
instrumento para aperfeiçoar a compreensão das distorções perceptivas e
emocionais do paciente; contrariamente à categoria anterior, elas não trabalham
com os princípios condicionantes;
3. abordagens que trabalham com pesquisas na área da saúde
física e mental e que partem do pressuposto de que imagens
"saudáveis" levam gradualmente a uma "realidade saudável",
sem, contudo, oferecerem interpretações ou teorias; e
4. abordagens que trabalham com técnicas profundas de
produção de imagens &– imaginação ativa, sonho guiado, jogo de areia
(sandplay) etc. &– e prognosticam a cura pela transformação psíquica, que
se serve de processos irracionais em oposição às terapias racionais e
reflexivas.
Nas diferentes abordagens, há sinais evidentes de um
reconhecimento do valor adaptativo, criativo e terapêutico da produção de
imagens psíquicas, em detrimento de um sentido regressivo, patológico ou
perturbador, que a visão inicial da Psicologia lhe atribuía. Por isso, muda
também a forma de abordar os produtos imagéticos no contexto clínico, que passa
de uma atitude interpretativa, reducionista e despotencializante para uma
atitude não-interpretativa, amplificadora e potencializadora. Em vez de uma
orientação interpretativa, que visa à tradução ou à explicação das imagens,
prioriza-se o estabelecimento de uma conexão emocional e vivencial com elas,
provavelmente o modo mais eficaz de se aproximar da realidade psíquica do
paciente.
(...)
As imagens não são vistas como representações, sinais, símbolos, alegorias ou comunicações, mas como fenômenos peculiares à psique. Propõe-se, portanto, um tratamento direto e vivencial da imagem, segundo o qual a explicação ou a interpretação egoicas são substituídas pela vivência, pelo tratamento lúdico e pela conexão emocional.
Enfatizam-se os aspectos funcionais e valorativos do arquétipo e não os formais e descritivos. Contrariamente à perspectiva simbólica, que tende a classificar as imagens em arquetípicas ou não a partir de sua forma &– mais ou menos universais &–, a perspectiva imagética da escola arquetípica propõe também a operacionalização desse conceito: o que torna uma imagem arquetípica é o modo como ela é tocada, não a forma dela.
Recorre-se ao sentido dado por Jung, segundo o qual os
arquétipos são portadores de significado, razão pela qual o que determina o
caráter arquetípico de uma imagem é sua capacidade de evocar significado, e não
sua forma. Qualquer imagem pode tornar-se arquetípica, à medida que, ao ser
trabalhada, passa a significar algo para o sujeito, revelando-se prenhe de
emoção, de mistério e de sentido.
Em relação à prática clínica, prioriza-se a produção de
imagens por meio de uma articulação poética da linguagem. Evocar imagens e
permanecer nelas, despertando seu valor arquetípico é, portanto, a base da
abordagem imagética proposta por essa escola.
Fonte: Scielo