O
Sábio negativo
Sentimo-nos bastante entorpecidos.
Ficamos tão obcecados com a necessidade de evitar a
formação de vínculos que não podemos nos comprometer com pessoas, projetos ou
ideias. Embora às vezes alimentemos a ilusão de que isso nos dá liberdade, o
fato é que não somos realmente livres. Estamos simplesmente com muito medo de
firmar um compromisso e, portanto, não podemos nos ligar realmente a alguém ou
a alguma coisa.
De mais a mais, o Sábio negativo frequentemente se
esforça em excesso para ser perfeito, sincero e estar sempre certo, não
demonstrando nenhuma tolerância em relação aos ensinamentos e vulnerabilidades
humanas normais. Esse Sábio muitas vezes é propenso a práticas ascéticas e está
sempre pronto a criticar a si mesmo e aos outros por qualquer sinal de
imperfeição. Nada lhe parece suficientemente bom.
Pode ser ainda que o Sábio negativo se sinta tão
dominado pela relatividade que lhe seja impossível realmente agir. Como posso
fazer alguma coisa, diz esse Sábio negativo, quando é impossível saber o que é
a verdade? Uma pessoa assim não pode se comprometer com um companheiro ou a
companheira porque não sabe como descobrir se essa é a pessoa certa para ela.
Também não pode se comprometer com algum tipo de trabalho porque não sabe se esta
é a coisa certa a fazer. Essas pessoas tendem a adotar uma atitude de ceticismo
por causa de uma elevada consciência da imperfeição de todo tipo de vida e de
sua incapacidade para conhecer alguma coisa com segurança.
Durante a meditação, o Sábio é a parte do nosso ser
que permanece além do nosso pensamento, dos nossos sentimentos e desejos,
simplesmente observando os acontecimentos. As práticas de meditação fortalecem
a parte de nós que é realmente objetiva, imparcial e capaz de observar sem ser
afastada nem mesmo pelas nossas necessidades e desejos mais prementes.
Elas
também nos permitem descobrir que não somos os nossos pensamentos nem sentimentos
e, portanto, não ficamos mais à disposição de cada um de nossos medos e
desejos. Algumas vezes, esse observador interior pode nos libertar
completamente dos pensamentos e dos sentimentos durante vários segundos, de
modo que mergulhamos em alguma realidade mais fundamental situada além daquela
da mente e do coração humano.
Essas práticas ajudam as pessoas a entrar em contato
com mais realidades – sejam externas, internas ou cósmicas – reconhecendo e
aceitando inicialmente a radical subjetividade da vida humana. Não podemos
enxergar a verdade que está além de nós mesmos antes de nos familiarizarmos com
os nossos preconceitos e predisposições. Esta é uma razão pela qual é difícil,
senão impossível, o indivíduo ser um Sábio em qualquer sentido verdadeiro sem
antes ter empreendido a sua própria jornada, pois é através dela que o
indivíduo encontra a sua identidade e, conscientemente , descobre quem
realmente é.
Até esta altura da jornada, a questão tem sido
encontrar a verdade subjetiva da pessoa e expressá-la no mundo. Doravante, o
Sábio precisa ligar-se a verdades situadas além de si mesmo.
Trecho retirado do livro “O despertar do Herói
Interior” (Carol S. Pearson).